STF julga necessidade de edição de Lei Complementar para cobrança da diferença de alíquota do ICMS
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou em 11/11/2020 o julgamento conjunto de dois processos que discutem a necessidade de lei complementar para disciplinar, em âmbito nacional, a cobrança do Diferencial de Alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (Difal/ICMS) exigida pelos estados. A análise do tema foi suspensa por pedido de vista do ministro Nunes Marques.
A matéria é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5469 e do Recurso Extraordinário (RE) 1287019, com repercussão geral (Tema 1093). Já votaram os ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio, relatores, respectivamente, da ADI e do RE, no sentido de declarar inconstitucional a cobrança.
A ADI 5469 foi ajuizada pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico contra as cláusulas 1ª, 2ª, 3ª, 6ª e 9ª do Convênio ICMS 93/2015 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que dispõem sobre os procedimentos a serem observados nas operações e nas prestações que destinem bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS localizado em outra unidade federada. Entre outros argumentos, a entidade alega que os dispositivos questionados tratam de matéria a ser regulamentada por lei complementar.
Com mesmo tema, o RE 1287019 foi interposto pela MadeiraMadeira Comércio Eletrônico S/A e outras empresas contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que entendeu que a cobrança do DIFAL, acrescentado à Constituição Federal (artigo 155, parágrafo 2º, incisos VII e VIII) pela Emenda Constitucional 87/2015, não está condicionada à regulamentação de lei complementar. As empresas alegam que a cobrança cria nova possibilidade de incidência do tributo e, portanto, exigiria a edição de lei complementar, sob pena de desrespeito à Constituição Federal (artigos 146, incisos I e III, alínea “a”, e 155, inciso XII, parágrafo 2º, alíneas “a”, “c”, “d” e “i”).
Para o relator do RE, ministro Marco Aurélio, a sistemática introduzida pela EC 87/2015 não dispensa a exigência constitucional da regulamentação da matéria via lei complementar. “Especificamente quanto ao ICMS, o constituinte foi incisivo e reiterou a exigência de lei complementar versando elementos básicos do tributo, entre os quais o contribuinte do local da operação”, afirmou.
Segundo o ministro, o caso indica que os estados e o Distrito Federal se anteciparam na disciplina da matéria, em usurpação da competência da União, a quem cabe editar norma geral nacional sobre o tema. Ele ressaltou a inadequação do instrumento utilizado e observou que não é possível que elementos essenciais do imposto sejam disciplinados por meio de convênio.
O relator votou pelo provimento do recurso para reformar o acórdão do TJDFT e assentar a invalidade de cobrança em operação interestadual envolvendo mercadoria destinada a consumidor final não contribuinte do Difal/ICMS, “tendo em vista ausência de lei complementar disciplinadora”.
Já o Relator da ADI, ministro Dias Toffoli, também ressaltou a necessidade de lei complementar para regulamentar a EC 87/2015 e observou que, antes disso, os estados e o DF não podem efetivar a cobrança de ICMS correspondente ao diferencial de alíquotas nas operações ou prestações interestaduais com consumidor não contribuinte do tributo. A seu ver, o Convênio 93/2015 não pode substituir a lei complementar. “Não se encontra, na parte permanente do texto constitucional, qualquer disposição no sentido de que convênios interestaduais podem suprir a ausência de lei complementar para efeito de tributação pelo ICMS”, afirmou.
O ministro Dias Toffoli votou pela procedência da ação direta, para declarar a inconstitucionalidade formal das cláusulas do Convênio ICMS 93/2015 do Confaz, e propôs a modulação dos efeitos da decisão para evitar prejuízo aos estados. Dessa forma, a retirada da cobrança do diferencial de alíquotas para as micro e pequenas empresas optantes do Simples Nacional valeria desde a concessão da medida cautelar na ADI 5464, em 2016. Já em relação às outras cláusulas, que trazem informações sobre o cálculo do diferencial de alíquota, os procedimentos a serem adotados e a necessidade de o contribuinte observar as legislações estaduais, os efeitos da decisão valeriam a partir de 2021. Já o ministro Marco Aurélio não modulou os efeitos da decisão.
Não há prazo definido para que o ministro Marques Nunes devolva a vista ao plenário e o julgamento tenha continuidade. Assim como no caso sobre o ICMS sobre licença de uso de softwares, ele afirmou que levará os recursos de volta ao colegiado “com a maior brevidade possível”.
Por sua vez, o Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) alertou que a eventual inconstitucionalidade provocará “graves desequilíbrios estruturais no maior imposto da economia brasileira”, com perdas de receitas de ICMS superiores a R$ 9 bilhões anuais aos estados e impacto direto na cota-parte dos municípios. Além disso, as receitas de ICMS ficariam concentradas nos estados onde a venda foi realizada, e não haverá mais a repartição com o estado onde vive o consumidor que adquiriu a mercadoria.