Operações com imóveis após a Reforma Tributária: haverá sobreposição de ITBI com IBS e CBS?
21 AGO 2024
1 - Introdução
A aprovação da EC 132/2023, que instituiu a Reforma Tributária, trouxe diversas mudanças significativas para as operações com imóveis. Este texto tem como objetivo analisar os efeitos dessas mudanças, especialmente no que diz respeito ao possível aumento na carga tributária decorrente da incidência simultânea do ITBI, IRPJ, CSLL e dos novos tributos sobre aquelas operações.
Atualmente tramitam no Congresso os PLP´s 68 e 108/2024, que regulamentam a reforma, sendo de especial relevância as normas do primeiro projeto que dizem respeito aos novos tributos sobre operações de consumo – o Imposto e a Contribuição sobre Bens e Serviços (IBS e CBS, respectivamente).
Estes tributos caracterizam-se por sua maior abrangência, passando a incidir também sobre direitos em geral, incluindo operações que hoje não são atingidas por todos os tributos vigentes sobre consumo, como é o caso da alienação, locação e arrendamento de imóveis, atualmente fora do campo de incidência de ICMS, ISS e IPI, sendo sujeitos apenas ao PIS e à COFINS.
A previsão de incidência do IBS e da CBS sobre alienação de bens imóveis e atos translativos ou constitutivos de direitos reais sobre imóveis (atualmente sujeitos ao ITBI), traz a seguinte dúvida: como irão se relacionar o IBS, a CBS e o ITBI? Haverá aumento de carga tributária nestas operações?
2 - Ampliação da Competência Tributária
Um primeiro aspecto diz respeito à ampliação da competência dos tributos. Até a promulgação da EC 132, a Constituição Federal atribuía a competência tributária sobre a transferência onerosa de imóveis intervivos através do ITBI apenas aos municípios, passando agora a ser tributável por todos os entes federativos, por meio do IBS e da CBS.
3 - Definição dos Contribuintes
Outro ponto importante é quanto à definição dos contribuintes nestas operações. Pela atual redação do PL 68/2024, os novos tributos alcançam a alienação, locação e arrendamento de imóveis, desde que não sejam “de propriedade de pessoa física sujeita ao regime regular do IBS e da CBS e não seja utilizado de forma preponderante em suas atividades econômicas”.
Apesar da interpretação difícil desta expressão normativa, que se espera seja corrigida no Senado, pode-se concluir que a tributação atingirá apenas pessoas jurídicas e pessoas físicas que explorem economicamente operações com imóveis de modo habitual, ou em volume que caracterize atividade econômica, os quais, por conseguinte, serão contribuintes do IBS/CBS.
4 – Base de Cálculo e Incidência dos Tributos
Outro aspecto a ser analisado é a possibilidade de inclusão de um tributo na base de cálculo do outro, já que todos incidirão sobre os mesmos fatos geradores. Nesse sentido, o PLP 68 dispôs claramente que o IBS e a CBS não compõem a base de cálculo do ITBI.
Por outro lado, a base de cálculo dos novos tributos para essas operações é o valor da operação de alienação do bem imóvel ou o valor do ato oneroso translativo ou constitutivo de direitos reais sobre imóveis. Embora não haja referência expressa ao ITBI, entende-se que este imposto não se inclui no valor da alienação ou dos atos de transmissão, motivo pelo qual não deverá ser computado na base dos novos tributos.
Assim, na forma como está hoje a redação do PLP 68, o IBS e a CBS não impactam a base de cálculo do ITBI e vice-versa.
Ainda sobre a base de cálculo, nas operações de alienação de imóveis será aplicado um “redutor de ajuste”, cujo objetivo é garantir a não cumulatividade dos tributos, assegurando que o contribuinte tenha uma espécie de crédito relativo aos imóveis adquiridos no passado e que não tiveram a incidência do IBS e da CBS.
Também o PLP 68 prevê um “redutor social”, isto é, uma dedução em montante fixo para imóveis novos e lotes residenciais, que representará uma redução mais significativa para imóveis de menor valor, garantindo-se uma progressividade nas operações com imóveis.
5 - Alíquotas e Redutores
Outro ponto essencial à análise é a alíquota prevista, que terá uma redução de 60% em relação à alíquota base do IBS e da CBS para as operações de locação, arrendamento e cessão onerosa de imóveis. Se confirmada a estimativa atual de que a alíquota combinada do IBS e da CBS seja de 26,5%, isso representaria alíquotas efetivas de 10,6%.
Também é importante salientar que haverá a possibilidade de o contribuinte apropriar-se de créditos das operações de aquisição de bens e serviços, fato que demandará profundas adaptações das empresas do setor que, em geral, operam em um regime cumulativo, além de um acompanhamento minucioso da regulamentação da reforma para a definição de que operações podem gerar créditos de IBS e CBS para o setor.
6 – Carga Tributária
Do acima exposto, pode-se concluir que haverá um provável aumento na carga tributária sobre as operações onerosas com imóveis com a instituição do IBS e da CBS, exceto para as operações com imóveis de menor valor, favorecendo o mercado de residências populares.
Como exemplo, se considerarmos uma empresa do ramo imobiliário que opera no regime do lucro presumido, teremos os seguintes tributos incidentes na venda de imóveis no sistema atual:
IRPJ: 2% (25% x 8%)
CSLL: 1,08% (9% x 12%)
PIS: 0,65%
COFINS: 3%
ITBI: em geral 3%
TOTAL: 9,73%
Com as alterações introduzidas pela EC 132/2023, teremos os seguintes tributos:
IRPJ: 2% (25% x 8%)
CSLL: 1,08% (9% x 12%)
IBS + CBS: 10,70% (26,75% X 40%)
ITBI: em geral 3%
TOTAL: 16,78%
7 - Conclusão
Em resumo, na versão atualmente em análise no Senado, onde já recebeu mais de 1.000 emendas, o PLP 68/2024 irá gerar um aumento de 72,46% na carga tributária incidente nas alienações de imóveis por empresas do setor.
Apesar deste aumento poder vir a ser atenuado pelos valores de créditos de IBS e CBS que possivelmente virão a ser apropriados pelos contribuintes, não é sem motivo a preocupação manifestada por empresas, investidores e adquirentes de imóveis de que a Reforma Tributária implique em aumento de custos e preços no mercado imobiliário.